Opinião

A Proximidade e a Perda

11 out 2024 21:30

Quando ocorrem perdas e aproximações - e ocorrem bastante mais vezes do que aquelas de que conseguimos ter plena consciência - provocam uma reacção imediata, “à pele”, difícil de controlar

Acredito que os dois mais importantes, porque imediatos, factores de relação de cada um consigo próprio, e com os outros, sejam a proximidade e a perda. Mais importantes do que sabermos quem somos, para onde queremos ir, ou o que, num futuro próximo, estará ou não ao nosso alcance fazer. Seja porque uma proximidade importante se dilui, seja porque uma muito desejada finalmente acontece, seja porque se precisa e provoca um afastamento, seja porque uma perda sucede de forma inevitável, seja ainda porque foi o nosso desinvestimento a permitir que sucedesse, estas duas formas de consciência de nós e da nossa incontornável ligação aos outros comanda em boa parte a nossa vida.

Quando ocorrem perdas e aproximações – e ocorrem bastante mais vezes do que aquelas de que conseguimos ter plena consciência - provocam uma reacção imediata, “à pele”, difícil de controlar.

Somos positivamente afectados com o acontecimento de uma proximidade desejada, com a perda de um vínculo negativo, ou com o distanciar de uma possibilidade assustadora; e negativamente afectados por uma perda difícil, pela diluição de laços numa relação importante, ou pela perspectiva de uma aproximação perturbadora.

Mas, muitas vezes, a consciência de que algo nos afecta não é clara, ou mesmo perceptível, e sobra-nos um mal-estar, uma tristeza, uma angústia, ou uma felicidade, indizíveis, que perpassam as horas dos nossos dias sem sabermos porquê.

Serão, provavelmente, fruto de perdas, de aproximações, e de afastamentos subtis a que não conseguimos prestar atenção, ou inconscientemente negamos, entregando os seus efeitos à espuma dos dias. Mas não é apenas com as pessoas que se cruzam connosco de forma mais ou menos directa que os efeitos da perda e da proximidade se manifestam, já que a empatia, que a maior parte dos seres humanos consegue sentir em maior ou menor grau, liga-nos a pessoas com quem nunca nos cruzaremos.

É o caso das vítimas de guerra, de catástrofes naturais, ou de abandono, dos indivíduos que praticam actos heróicos, ou dos que dispõem da sua vida em favor da vida de outros; ao conhecer, sentimo-nos próximos e sentimos as suas perdas ou a vontade de estar perto, tal como sentimos asco e distância com o conhecimento dos actos de um vigarista, de um violador ou de um assassino. E não apenas na vida real.

Também nos livros e, sobretudo, nos filmes, é possível sentirmos uma comovente proximidade, ou perda, distância ou felicidade, próximas da dos personagens, mesmo sabendo que de ficção se trata e por muito absurdo que nos pareça, e queiramos manter em segredo.

Com maior ou menor intensidade, provocada pelas nossas acções, fruto das circunstâncias, ou apenas porque delas temos notícia, de sinal positivo ou negativo, com plena ou pouca consciência, perda e proximidade influem inevitavelmente na nossa vida pessoal, quotidiana. E, mesmo assim, é notável a nossa tão frequente desatenção e ao que ela possa provocar na vida dos outros que nos são próximos.