Opinião
Cinema | Olfacto-Visão
Recentemente, ao pesquisar na Internet as possíveis relações entre o cinema e o sentido do olfacto, deparei-me com uma história aparentemente esquecida.
Tudo parece ter começado com um sistema denominado AromaRama, que libertava aromas através do ar-condicionado dos cinemas e que foi utilizado pela primeira vez no travelogue Behind The Green Wall, em 1959.
Esta técnica, criada por Hans Laube, apareceu uma única vez no filme de ficção de 1960 Scent of Mistery, do produtor Mike Todd Jr.
O Smell-O-Vision libertava 30 odores diferentes nos assentos dos espectadores em momentos precisos do decorrer do filme.
Os custos desta operação eram elevadíssimos e, como tal, os bilhetes custavam entre 25 a 30 dólares (numa altura em que um bilhete normal se comprava por um dólar), para que se pudessem instalar e propagar estes odores.
No entanto, os entusiásticos anúncios ao filme proclamavam: “Primeiro moveram (1895)! Depois falaram (1927)! E agora cheiram!”
Cenas memoráveis deste filme que serviu para que se experimentasse o Smell-O-Vision incluem uma em que barris de vinho caem de uma carruagem e rolam monte abaixo, partindo-se contra uma parede, sendo nessa altura espalhado um apropriadíssimo odor a uva; ou aquelas em que o assassino era identificado pelo cheiro a fumo de cachimbo.
Infelizmente, o mecanismo não terá funcionado tão bem quanto se esperava. De acordo com a revista Variety, os aromas eram libertados com um muito distintivo e incomodativo sibilado e os membros da audiência sentados nos balcões queixaram-se de que os odores chegavam aos seus assentos alguns segundos após o aparecimento da acção no ecrã.
Noutros assentos do cinema, os odores eram tão ténues que a audiência cheirava ruidosamente numa tentativa de os conseguir vivenciar.
Eventualmente, os problemas técnicos do Smell-o-Vision foram resolvidos, mas tarde demais, pois a conjuntura de críticas negativas da imprensa juntamente com o desapontamento dos espectadores que passava de boca em boca levaram a que o filme falhasse miseravelmente.
Diz-se que o comediante Henny Youngman terá gracejado, na altura, que “estava constipado, com o nariz bloqueado, e por isso não tinha percebido o filme”.
Mais tarde, o filme teve uma segunda vida, recebendo o novo titulo de Holiday in Spain e sendo re-distribuído, já sem odores, no sistema Cinerama.
Sobre esta “segunda vida” do filme, no jornal The Daily Telegraph lia-se: “o filme adquiriu uma qualidade desconcertante, quase surreal, já que não havia motivo para, por exemplo, se retirar um pão do forno e empurrá-lo para cima da câmara por um tempo que parecia inexplicavelmente longo”.
Em 2015, a produtora de cinema australiana Tammy Burnstock e a artista e criadora de perfumes Saskia Wilson-Brown reviveram a experiência Smell-O-Vision, apresentando o filme restaurado em Los Angeles, na Dinamarca e em Inglaterra.