Opinião
Da necessidade de sorrir
Há dois dias morreu um senhor de quem gosto muito: Joaquín Tejón, o Quino.
Hoje apetecia-me escrever uma crónica ligeira, suave, daquelas que nos obrigam a pensar, mas nos deixam um sorriso de satisfação nos lábios e contribuem para melhorar o nosso humor.
Para mim não é uma tarefa fácil porque amiúde me dizem que levo tudo muito a sério e quando tento ser irónico dizem-me que estou a ser sarcástico.
Eu penso exatamente o contrário, mas como os outros são a maioria, devem ter razão, e a democracia é a expressão da voz de todos. Como se não bastasse, hoje sinto-me acabrunhado.
Há dois dias morreu um senhor de quem gosto muito: Joaquín Tejón, o Quino.
Pai da Mafalda e criador de cartoons que nos fazem sempre sorrir, pensar e refletir seriamente sobre o papel que cabe a cada qual no todo que somos enquanto civilização. Quino fez parte da bibliografia essencial com que tentei educar os meus filhos.
Creio que gostaram de o conhecer e se refletiu na nossa identidade, pelo menos a julgar por terem passado por um período de aversão à sopa, o que me leva a crer que a Mafaldinha lhes ficou na memória.
Entre o desejo de querer escrever com uma réstia de humor, a tristeza pela morte de uma pessoa que admirava – já agora: se a pessoa que me levou aqui do consultório, por engano com certeza!, a minha caricatura desenhada pelo punho do Quino quiser fazer o favor de me a devolver, fico grato e reconhecido, podendo deixá-la anonimamente na minha caixa de correio – e esta angústia que é sempre escolher um tema, dei comigo a pedir a uma muito amiga o favor de um tema inspirador.
Não se fez rogada e enviou-me um desenho do Quino onde uma “madame” dá instruções à servente para limpar e arrumar o caos em que está transformada uma sala.
No quadrinho seguinte a sala está imaculada e a “madame” olha para uma reprodução da Guernica, de Picasso, que a empregada resolveu recriar e as personagens sofridas da guerra têm agora um ar sorridente, tendo a minha amiga apostado na legenda: tudo depende do ponto de vista.
Ora toma, nem de propósito esta coincidência, embora eu adivinhe o seu luto também por uma figura que ela muito aprecia.
Depois fez ainda o favor de me contar um episódio ocorrido numa sua aula e que transcrevo na íntegra com a respetiva vénia e agradecimento: “Há dias numa aula de História de Arte, depois de falar da democracia ateniense, prometi à turma que os deixaria sair mais cedo se me soubessem responder a uma questão.
Escolhi um aluno aleatoriamente e a questão era ‘Qual o regime político de Atenas?’
Um dos alunos disse antes de eu perguntar: ‘não me pergunte a mim que eu sou burro!’, claro que o escolhi porque a questão era fácil e assim lhe proporcionava a oportunidade de brilhar.
Resposta do aluno: ‘monarquia’. Como os colegas estavam proibidos de ajudar sob pena de ficarem até ao toque, uma miúda disse-lhe baixinho: ‘é o contrário!’.
O aluno em causa, pensativo e a juntar as letras confuso: ‘Aiuqranom?’ E ainda rematou com ar sério, ‘Fica bué estranho!’ Foi hilariante e fez-me rir e só por isso o aluno foi o primeiro a sair de uma sala onde não se veem os sorrisos”.
E pronto, assim dou por cumprido o meu compromisso de colaboração com o nosso JORNAL DE LEIRIA.
Espero ter-vos feito sorrir mesmo que por detrás da máscara.
Até breve!
Texto escrito segundo as regras do Acordo Ortográfico de 1990