Editorial
Memória curta
Com a pressa de recuperar o tempo ‘perdido’, muitas redes de apoio perderam-se
Há cinco anos, enfrentávamos uma das crises mais desafiadoras da nossa história: a pandemia da Covid-19. Durante meses, o medo, a incerteza e a solidão foram sentimentos comuns a milhões de pessoas, independentemente da sua localização ou condição social. Foi um tempo de angústia, mas também de reflexão e mudança.
Muitos de nós, confrontados com a fragilidade da vida, tomaram consciência da importância do outro, da necessidade de apoiar quem mais precisava e de fortalecer laços comunitários. Entre as mudanças mais visíveis estiveram as transformações na saúde, na educação e na forma como nos relacionamos enquanto sociedade.
Na saúde, a pandemia acelerou a digitalização, com consultas online e mais investimento na ciência e na investigação médica. Aprendemos sobre a importância da prevenção, da higiene e da vacinação, mas hoje assistimos ao relaxamento em muitas dessas práticas. O uso de máscara em situações de maior risco, o hábito de higienizar frequentemente as mãos e a atenção à ventilação dos espaços foram sendo esquecidos.
Na educação, a pandemia forçou uma revolução no ensino, com a adopção do ensino à distância e o aumento do uso da tecnologia em sala de aula. No entanto, a desigualdade no acesso digital evidenciou a necessidade de políticas mais inclusivas, um debate que parece ter perdido força com o passar do tempo. E a saúde mental dos alunos agravou-se.
Na sociedade, vimos vizinhos a organizarem redes de apoio, jovens a fazerem compras para idosos, famílias a reaproximarem-se e a tecnologia a ser usada para combater o isolamento social. Multiplicaram-se campanhas para garantir que ninguém ficava esquecido. O isolamento dos mais vulneráveis sensibilizou-nos e, por um momento, acreditámos que, enquanto sociedade, tínhamos aprendido uma lição valiosa sobre empatia e solidariedade.
No entanto, essa mudança parece ter sido temporária. Com a pressa de recuperar o tempo ‘perdido’, a atenção aos idosos voltou a ser esporádica, a preocupação com os que vivem sós tornou-se secundária e muitas redes de apoio enfraqueceram ou perderam-se mesmo.
Perante isto, será que a maior tragédia foi a pandemia em si ou a incapacidade de aprendermos com ela?