Opinião
Música | Parar e escutar
Tive o privilégio de estar presente e testemunhar a genialidade deste jovem compositor que sempre me fascina pelo seu imenso talento e generosidade, num franco testemunho de humildade e dedicação à música e ao instrumento
Parar e escutar é o sobrenome do novíssimo e primeiro trabalho de originais do conterrâneo pianista e compositor Tiago Ferreira.
Reflexos eremitas é o primeiro nome.
De tal forma sugestivo este título, que facilmente nos remete para um possível momento cronológico de criação ou de maturação criativa, ou não fosse a pandemia a verdadeira força de contenção de uma sociedade que, até então, girou sem eixo (e sem atrito!).
Quem ler estas linhas, certo será que conhece ou já escutou o piano do Tiago Ferreira num dos muitos projetos que acompanha.
Além de lecionar aulas daquele instrumento, toca regularmente como pianista intérprete e autor, e ainda pianista acompanhador, nas mais diversas formações, sobretudo na área do Jazz, destacando o Leiria Jazz Group, Trio Suspenso, JAZZing X'mas, e a Orquestra de Jazz de Leiria, mas também com contribuições nas áreas da música tradicional, Pop/Rock (elemento da banda Bússola, ao piano e acordeão) e da música clássica; a este respeito, participou – por exemplo - como pianista na apresentação do Requiem de Fauré em abril de 2013 pela Filarmónica de Monte Redondo e coro, e mais frequentemente como pianista acompanhador do Coro Viva Voz, de Santa Catarina da Serra.
De facto, foi a pandemia causada pelo novo coronavírus e o impacto psicológico e social que os sucessivos períodos de isolamento nos trouxeram que deram o mote e inspiração para a torrente criativa que o Tiago materializou neste extraordinário álbum de peças para piano solo: Reflexos eremitas (Parar e escutar), com uma evidente porção de música escrita, mas também com laivos de improvisação.
Encontrando em Brad Mehldau uma das suas maiores inspirações, socorreu-se de um apoio financeiro que proveio do belíssimo Programa Garantir Cultura, um apoio universal (não concursal), a fundo perdido e que visou estimular e promover a atividade artística e cultural, dinamizadas pelos setores quer público quer privado, este compositor teve a oportunidade de se focar por completo na dimensão criativa e – como tantas vezes acontece aos músicos – abstrair-se dos habituais constrangimentos de procura de financiamento para a materialização deste género de trabalhos.
Natural de Casal Novo, o Tiago iniciou os estudos de piano no Orfeão de Leiria, Conservatório de Artes, com a professora Vesna Manojlovic, tendo posteriormente ingressado a Escola de Jazz Luís Villas Boas (Hot Club de Portugal) em Lisboa, onde concluiu o curso de piano variante Jazz. Marlene Salgueiro, da Mosho Atelier em Leiria, esteve a cargo do design gráfico da capa deste disco, que se debruça num elemento fotográfico de Ana Joaquim, aludindo a um porto de abrigo e esperança; de notar a preocupação do Tiago em incluir o elemento de sistema de leitura e escrita tátil para cegos (braille), por forma a tornar toda a informação o mais inclusiva possível.
A primeira apresentação oficial deste trabalho teve lugar ainda este ano, no mês de Março, no Teatro Miguel Franco.
Tive o privilégio de estar presente e testemunhar a genialidade deste jovem compositor que sempre me fascina pelo seu imenso talento e generosidade, num franco testemunho de humildade e dedicação à música e ao instrumento.
A não perder!
Texto escrito segundo as regras do Acordo Ortográfico de 1990