Opinião
São os mercados a funcionar?
Quando se ouve responsáveis políticos gritarem, alto e bom som, que os contratos são para se cumprir, dever-se-ia bater as palmas, e lembrar a esses mesmos políticos que os primeiros contratos assinados foram com o povo.
E a vida anda numa roda viva. Corre mais depressa que nós. Ainda não percebemos muito bem o que aconteceu, e o que aconteceu é já outra coisa.
Hora de escrever este texto. E sobre o quê? A Europa desportiva aos nossos pés no atletismo, no futebol e no hóquei em patins? As desgraças alheias, mas que nos contaminam, como o atentado em Nice, o falso golpe de estado na Turquia, mais um tiroteio nos EUA ou o mais que previsível pedido de resgate financeiro do Deutsche Bank? É que há sempre algo mais novo, mais sugestivo, mais perigoso, mais cruel, mais...
Não. Hoje, hoje temos de ir a uma novela gráfica.
Presas Fáceis de Miguelanxo Prado é uma estória e um trabalho de urgência. Uma obra a preto e branco, feita a grafite, cheia de sombras de muitos cinzentos, de um traço rápido e imperfeito, mas objectiva e muito realista, riscada, furiosa e feita com pressa.
Esta obra fala de um evento real que se passou em Espanha, mais propriamente na Galiza, há poucos anos. Uma série de artifícios bancários pouco claros, levou a que muitos reformados perdessem as economias de uma vida inteira e alguns mesmo a própria casa. Pegando numa banal estória policial onde dois policias perseguem um caminho por onde vão nascendo quadros bancários assassinados, Miguelanxo Prado traz a horrível banalidade do dia-a-dia na Europa para o mundo da banda desenhada. São só os Mercados a funcionar, diz-se. Mas quem comanda os Mercados são homens. E é desses homens que Prado fala.
Quando se ouve responsáveis políticos gritarem, alto e bom som, que os contratos são para se cumprir, dever-se-ia bater as palmas, e lembrar a esses mesmos políticos que os primeiros contratos assinados foram com o povo.
*Cineasta
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