Opinião
Segurança ou liberdade?
O medo, sempre o medo. Medo do trânsito, medo da pedofilia, medo de assaltos, medo do bullying.
É um dos dramas da nossa civilização, uma escolha difícil de fazer, uma luta contínua dentro de muitas cabeças. Zygmunt Bauman, filósofo polaco falecido no ano passado, chamava-lhe a dicotomia da liberdade, recorrendo a Sigmund Freud para afirmar que é um dilema insolucionável.
“A civilização é sempre uma troca - ao escolher a liberdade, é preciso abrir mão de alguma segurança; ao escolher a segurança, é preciso abrir mão de alguma liberdade”, escreveu Freud na sua famosa obra O mal-estar da civilização, afirmando que o problema da sua geração, nos anos 20 do século passado, foi que abdicou em demasia da liberdade em favor da segurança.
Em 2013, Bauman afirmava que o problema era inverso, estando-se, na sua opinião, a privilegiar excessivamente a liberdade, descurando a segurança, convicção que, eventualmente, poderia hoje ser diferente, pois, em resposta ao medo provocado pelo terrorismo, são muitos os que concordam com algumas restrições à liberdade defendidas por partidos de extrema direita, algumas das quais colocadas já em prática por diversos governos de países europeus.
É, sem dúvida, o medo a sobrepor-se a um dos principais valores da democracia, pelo qual tantas pessoas lutaram e deram a vida, abrindo caminho ao populismo e à demagogia, em muitos casos com a ajuda da comunicação social, que na guerra das audiências usa e abusa do sensacionalismo e das notícias de sangue.
A verdade é que a criminalidade na Europa tem vindo a descer consistentemente há vários anos, apesar de não ser essa a percepção que muitos terão, influenciados pelo que vêem na televisão e nos jornais, assim como nas redes sociais, aproveitadas cada vez mais pelos movimentos populistas, para quem o medo é um poderoso aliado.
No fundo, é a natureza humana a falar através de uma das suas emoções básicas, levando a que, muitas vezes, se aja em sentido contrário ao que é entendido como correcto. Vem toda esta reflexão a propósito do trabalho que o Jornal de Leiria publica esta semana, onde se constata que, actualmente, a maioria das crianças são transportadas para a escola de carro, mesmo quando as distâncias são diminutas.
As razões?
O medo, sempre o medo. Medo do trânsito, medo da pedofilia, medo de assaltos, medo do bullying. Medo de coisas que sempre existiram, mas que agora estão mais presentes pela ampliação que lhes dão a comunicação social e as redes sociais.
De pouco parecem servir os alertas de especialistas para o facto de tanta protecção, ou falta de liberdade, poder vir a gerar jovens pouco autónomos, com baixa autoestima e mal preparados para fazer face ao imprevisto e à adversidade, além da questão do sedentarismo e da reduzida interacção social.
O medo é mais forte. Voltando ao início, é a segurança a condicionar a liberdade.
*director