Sociedade
Adesão de Portugal à UE: 30 anos depois, nível de vida continua inferior à média europeia
A entrada de Portugal na então CEE mudou o país e a região. Os milhares de milhões de euros recebidos ajudaram a modernizar a economia, mas nem sempre foram aproveitados da melhor maneira
Depois de vários anos em “rota de convergência” com a União Europeia, nos anos seguintes à adesão e na década de 1990, Portugal passou a um “processo visível de divergência” nos anos recentes, em que vigorou o programa de ajustamento.
Esta é uma das conclusões do estudo Três décadas de Portugal Europeu: balanço e perspectivas, segundo o qual em 2013 o nível de vida das famílias portuguesas era 25% inferior à média europeia, “a mesma distância que registava em 1990”.
O trabalho, coordenado pelo economista Augusto Mateus para a Fundação Francisco Manuel dos Santos, marca as três décadas da adesão de Portugal à então Comunidade Económica Europeia (a entrada de pleno direito aconteceu a 1 de Janeiro de 1986).
Analisa a evolução de 25 indicadores da área social e de outros tantos da área económica, situando o País no contexto europeu e apontando tendências de futuro. “A concretização com sucesso da transição de ‘país da coesão’ para ‘país da moeda única, que deveria ter moldado a gestão dos ciclos de programação 2000-2006 e 2007-2013, não foi conseguida”, lê-se no documento.
Esta era já uma das conclusões de um trabalho anterior coordenado também por Augusto Mateus, a propósito dos 25 anos da adesão, e que “sai muito reforçada neste segundo estudo”, que conclui que Portugal se situa num “insustentável posicionamento de meio caminho”.
Esta “posição insustentável requer uma trajectória de progresso, em termos de uma competitividade inseparável de uma efectiva coesão económica, social e territorial que, no entanto, só poderá ser alcançada com prioridades e objectivos muito mais focalizados e com uma afectação de recursos muito mais concentrada e, portanto, muito mais difícil de consensualizar”.
Significa isto que tal nem sempre terá acontecido durante estes anos em que Portugal recebeu 96 mil milhões de euros de fundos comunitários (ver caixa). Além da “consolidação da democracia” e do fim das “veleidades revolucionárias de alguns”, Ricardo Charters d’Azevedo aponta dois tipos de vantagens da adesão de Portugal à agora União Europeia: os aspectos sociais, quer na saúde (com impacto na esperança de vida e na redução da mortalidade infantil), quer na educação, pois permitiu comparações de indicadores e a adopção das melhores práticas europeias”.
Também aumentou o nível da formação profissional e do bem-estar global no País. Para o antigo director do gabinete da CE em Portugal, há também a realçar a vertente económica, com os vários investimentos concretizados, “uns bons, outros menos bons”, mas que permitiram melhorar as condições do nosso tecido empresarial.
Apesar da “má utilização de alguns fundos, o balanço é positivo”, entende Charters d’Azevedo, para quem o País conseguiu uma “panóplia de melhorias que não teria conseguido obter sozinho”, até porque além do dinheiro recebeu apoio técnico.
Entre os inúmeros projectos executados com verbas comunitárias pode referir-se a construção de milhares de quilómetros de auto-estradas, vias principais e complementares, aposta da qual a região de Leiria também beneficiou.
Além disso, só no I Quadro Comunitário de Apoio (1989- 1993), e a nível nacional, foram construídos 662 estabelecimentos de ensino e 132 infra-estruturas culturais. Foi também neste período que se iniciou a construção de três novos hospitais no País, entre eles o de Leiria, que seria concluído no II QCA (foi inaugurado em 1995).
Tudo isto a par dos muitos milhões que chegaram às empresas. Para Eduardo Louro, a região de Leiria “aproveitou os fundos comunitários para crescer, talvez até de forma mais equilibrada do que o resto do País”.
O investimento em infra-estruturas e acessos permitiu-lhe “ganhar uma centralidade que de todo não tinha”, diz o economista de Leiria, lembrando as muitas horas que eram necessárias para ir da nossa região para o Norte ou para o Sul do País antes da existência da A1.
A nível empresarial, a adesão de Portugal à UE permitiu à região consolidar algumas das suas actividades, e diversificar, mas também houve muitas indústrias que “perderam o comboio”. Eduardo Louro lembra por exemplo o sector têxtil, forte no Norte do distrito e em Mira de Aire antes da entrada na Europa, e que acabou por praticamente sucumbir ao longo dos anos da integração.
Também as pescas sofreram, com a redução da frota. No entanto, “ponderados os ganhos e as perdas, os primeiros superam as segundas”, considera. O economista lembra ainda a mudança nos padrões de consumo, permitida pela pertença ao projecto europeu.
Com crédito mais barato, as famílias passaram a ter acesso a muitos bens que antes pareciam inacessíveis. O “pequeno comércio tradicional” sofreu as consequências do aparecimento da grande distribuição. “Quando se atingem determinados padrões de consumo, passa a justificar-se outro tipo de investimento a nível comercial”, diz.
Fundos comunitários
Quase 100 mil milhões de euros para Portugal
Entre 1989 e 2013, o volume total de fundos estruturais e de coesão disponibilizados a Portugal superou os 96 mil milhões de euros.
Somando -lhe as contrapartidas pública e privada nacionais o montante global de investimento programado ascende a 178 mil milhões de euros, valor que “supera a riqueza anualmente gerada pela economia portuguesa”.
O JORNAL DE LEIRIA tentou obter dados relativos aos fundos canalizados para o distrito no mesmo período, mas não foi possível em tempo útil.
Dados da CCDRC, relativos ao Programa Operacional Regional do Centro (QREN 2007-2013) revelam que Leiria viu aprovadas 800 operações, que envolveram 378 milhões de euros, mas só 285 milhões foram efectivamente executados.
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