Economia
IPA 300, automóveis produzidos em Porto de Mós regressam a casa e podem ser vistos a partir de sábado
Automóveis criados por João Monteiro da Conceição tinham design compacto, económico e aspecto futurista
A Central das Artes, novo espaço que será inaugurado no dia 25, sábado, no âmbito das Festas de São Pedro, em Porto de Mós, recebeu um ícone da história do automóvel em Portugal e motivo para uma visita mais demorada.
Os automóveis da marca Indústria Portuguesa de Automóvel (IPA), construídos na vila, na década de 50 do século passado, até agora expostos no Museu do Caramulo, passaram a integrar o espólio da Central das Artes.
“Um verdadeiro regresso às origens que muito nos orgulha. Gratidão à família do engenheiro Monteiro da Conceição e em particular ao seu filho arquitecto José Charters Monteiro que tudo fez para tornar possível esta nossa ambição”, agradece o presidente da câmara, o social-democrata Jorge Vala.
O acordo para a cedência deste património da IPA por parte da família Charters Monteiro foi anunciado pela autarquia em Julho do ano passado e agora concretizado, ficando os veí- culos, o protótipo e os dois exemplares produzidos, à guarda permanente do município.
O IPA 300, concebido em versões coupé de dois lugares e para famílias com duas crianças, foi produzido na plataforma onde, em tempos, funcionou a Empresa Mineira do Lena e, mais recentemente, a Ricel, à entrada de Porto de Mós.
Os veículos produzidos foram homologados e receberam matrículas e livretes, mas a licença para a produção em série foi recusada pelo Governo do ditador Oliveira Salazar.
A exposição “Microcarros, grandes histórias”, que esteve patente no Museu do Caramulo, no ano passado, dava conta de que este automóvel nasceu da paixão, do engenho de João Monteiro da Conceição, engenheiro e empresário de Porto de Mós, e de um acaso.
Corria o ano de 1954, quando António Gonçalves, proprietário de um Lusito, outro automóvel nascido em território nacional, sofreu uma avaria mesmo junto à oficina de metalomecânica de Monteiro da Conceição, que foi chamado a ajudar.
Palavra puxa palavra e os dois tornaram-se sócios na Indústria Portuguesa de Automóveis – O Quadriculo Lda.
“O meu pai tinha uma paixão muito grande por automóveis e, apesar da sua formação ser em engenharia civil, tinha experiência em engenharia de minas e de máquinas, fruto do trabalho que teve na Empresa Mineira do Lena”, referiu José Charters Monteiro ao JORNAL DE LEIRIA, aquando da exposição no Caramulo.
O objectivo era a produção de um veículo que pudesse ser construído em série e comercializado, de acordo com as necessidades da população portuguesa.
Para isso, Charters Monteiro investiu saber e dinheiro no projecto. Segundo o Museu do Caramulo, a base mecânica do IPA 300 era a do veículo inglês Astra.
Dada a ausência de produtores na indústria nacional, a IPA teve de recorrer ao mercado estrangeiro para encontrar componentes, como a caixa de velocidades, o diferencial, a direcção, os travões e partes eléctricas.
O modelo era agradável à vista, compacto, económico e tinha um aspecto futurista. Teria tudo para se tornar num sucesso de vendas. Só não tinha a licença para produção em série emitida pelo Estado Novo.
Foi pedida em 1956 e esbarrou na “oposição do então secretário de Estado da Indústria”, que já tinha acordado com grandes marcas americanas e europeias a montagem no País dos seus próprios veículos. Outros interesses “mais estratégicos” se levantaram.
Foi emitido um regulamento que proibia a produção nacional e que atingiu directamente o projecto do IPA. Os exemplares foram arrumados a um canto da fábrica e aí ficaram durante décadas até que, em 1987, o filho de Charters Monteiro os encontrou “rodeados de sucata”.
Restaurados, irão agora ocupar um lugar de destaque na Central das Artes.