Sociedade

Leiria: cidade em recuperação

13 out 2016 00:00

Após décadas de degradação, o centro de Leiria parece estar em recuperação. Entre obras concretizadas e projectadas, são dezenas os edifícios, alguns deles emblemáticos, que darão outra vida à cidade. Os investimentos estão a surgir em resposta à procura

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Maria Anabela Silva

Durante anos, o estado de abandono do centro histórico de Leiria, de que a degradação do edificado era a face mais visível, fez correr muita tinta. Agora, parecem soprar ventos de mudança, com a reabilitação, já concretizada ou em vias disso, de vários imóveis, emblemáticos na cidade (ver infografia abaixo).

A esses, junta-se a recuperação de muitos outros de dimensão mais pequena. Nos últimos três anos foram requalificados 19 imóveis dentro da Área de Reabilitação Urbana (ARU) do centro histórico, 11 dos quais, no núcleo mais antigo da cidade, havendo, actualmente, mais de uma dezena de edifícios em obras e nove projectos em apreciação.

A par do arrendamento, a recuperação dos imóveis para alojamento local é uma das soluções que começa a ganhar adeptos entre os investidores. Depois de 22 anos a trabalhar no estrangeiro, Vítor Rei decidiu regressar às origens.

Só que, em vez de se fixar na aldeia onde havia construído uma moradia, escolheu o centro da cidade, não só para viver, mas também para investir. Ao espaço que já tinha adquirido na zona histórica e que está arrendado para restaurante, juntou a compra do prédio onde está instalada a Funerária Nogueira e Pina, na 'Rua Direita'.

O objectivo é recuperar o edifício para alojamento local. “Há procura para este tipo de unidades. E Leiria está, cada vez mais, na moda. Tem boa qualidade de vida e boas condições em termos de infra-estruturas”, diz Vítor Rei, confessando que essas foram duas das razões que o levaram a fixar residência na cidade.

Esses são, na óptica de Rita Bernardes, consultora da Remax em Leiria, alguns dos factores que justificam a “grande dinâmica” que a reabilitação urbana está a ter no centro histórico, com “crescente procura” por parte de investidores, “muitos deles virados para a reabilitação destinada a alojamento local e turismo”.

Como exemplo, aponta dois imóveis que comercializou recentemente (um na Praça Rodrigues Lobo e outro na 'Rua Direita' – o de Vítor Rei), para esse fim. Sofia Ferreira, gestora de negócios da Campinoise, empresa que tem vários investimentos no centro histórico, realça ainda o mercado do arrendamento, falando mesmo em “procura absurda”, nomeadamente, por parte de casais jovens, “entre os 30 e os 35 anos”, que se querem fixar no centro histórico.

A título de exemplo revela que os dois mais recentes projectos da Campinoise – requalificação e ampliação de um edifício na Travessa das Amoreiras e reabilitação da Casa do Arco – já têm uma “quantidade enorme” de interessados, apesar de as obras ainda não terem começado.

“Há anos que se esperava que o centro histórico começasse a mexer. Finalmente, parece que as coisas estão a acontecer. Mas, ainda estamos numa fase inicial”, nota o arquitecto João Patrício, que aponta o “mercado” como o principal factor para a dinâmica que a reabilitação urbana está a ter na cidade.

“Nos anos de crise, a construção nova reduziu-se a quase nada, o que favoreceu uma certa aposta na reabilitação, com a oferta de um produto diferente e mais vocacionado para o sector médio-alto”, acrescenta. Mas nem tudo são rosas e ainda subsistem alguns obstáculos.

Segundo Sofia Ferreira, um deles prende-se com o preço pedido pelos proprietários dos imóveis, que, por vezes, atingem números “surreais”. “Esquecem-se que ao valor da compra, temos de acrescentar o dobro ou o triplo para a reabilitação”, refere a consultora da Campinoise.

Esse aspecto é também sublinhado por Rita Bernardes, contando que, depois de “há dois ou três anos, os preços terem baixado significativamente”, o que favoreceu a concretização de muitos negócios, “estão a subir novamente”.

Por seu lado, o arquitecto João Patrício aponta um outro aspecto que também tem reflexos no preço final da obra: os custos com os trabalhos de arqueologia, que, “apesar de serem de interesse público, recaem unicamente no promotor” e que “são, cada vez, mais exigentes”, o que pode “fazer subir demasiado o produto final”.

Para o técnico, seria também importante “definir melhor” os critérios de atribuição de benefícios fiscais que, “às vezes, suscitam dúvidas”. Promotores e consultores imobiliário apontam ainda a burocracia associada aos licenciamentos como outra das dificuldades, apesar de, em geral, reconhecerem “as melhorias registadas” nos últimos anos.

“A Câmara devia facilitar ainda mais e promover uma maior proximidade entre os investidores”, diz Rita Bernardes. Por seu lado, Sofia Ferreira diz que a questão não está tanto na autarquia mas na “própria legislação que impõe pareceres de inúmeras entidades”. 

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