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Palavra de Honra | O futuro é um antro de ansiedades

12 mar 2020 00:00

Flávia Sousa, Designer e Presidente da Collippo

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- Questiono-me se... algum dia as Instituições leirienses vão apostar num branding fresh que traduza ideias claras, coerentes e com identidade, plano para o qual já avançaram municípios como o Porto, que colhe os frutos dessa ambição já há uns pares de anos. Talvez o brasão com o qual a Cidade se apresenta possa dar lugar a uma imagem que não o esqueça mas que o reinvente e que, interligado com um plano forte e conciso, seja capaz de apresentar Leiria aos seus e aos outros como um sítio onde efectivamente há ideias e coisas a acontecer. Essa cidade criativa em que vivemos e a tal capital da cultura com que sonhamos.

- Adoro...bróculos meio cozidos e comer vegetais crus em geral; ir ao mercado; olhar para o mapa da península ibérica e traçar a próxima roadtrip; ver (repetidamente) o RuPaul's drag race; dançar de pé descalço pela casa; dormir no sofá; ir à praia na maré baixa e procurar caranguejos escondidos; comer uma mariscada no Santo da Nazaré; ir a formações pela Europa fora; conhecer pessoas de todo o lado com corações grandões e histórias incríveis; comer com as mãos; fazer caminhadas com a velhota; ouvir a sabedoria do campo do velhote; beber um bom vinho com as amigas e sentir o cheiro a camarinhas.

- Lembro-me tantas vezes... de comunicar as leituras dos contadores de água e luz mas acabo sempre por me esquecer. Vivo a vida por estimativas.

- Desejo secretamente... que o associativismo consiga sair da dependência dos fundos e fundinhos. Era incrível que as associações soubessem comunicar à sociedade civil o impacto que realmente têm nela, o que podia alavancar a alteração de paradigma. O sector tem muito potencial mas ainda não aprendeu a não ter medo de assumir que é imprescindível na vida da comunidade e a reclamar proveito disso. Sim, isto é uma mensagem de self-love associativo.

- Tenho saudades...  de ser uma carpinteira falhada nas oficinas da Faculdadde de Arquitectura. Das pausas para almoço na mata de Monsanto, de barriga ao sol e de Walden na mão; das aulas de estética, quando ainda conseguia ler Walter Benjamin. A vida já foi um sítio bem idílico.

- O medo que tive... de ter um smartphone e todas as aplicações inerentes. Tenho um há menos de um ano, porque a vida dos emails assim o quis. Criei a minha conta no Whatsapp há poucos meses. Ainda me assusta a ideia de estar sempre online para o mundo, e principalmente para o trabalho, e creio convictamente que isso não está assim tão bem como querem fazer parecer. Sinto que, de uma forma muito inconsciente, andamos a abdicar do nosso merecido tempo de ócio, chamando-lhe "momentos de não produtividade". Dou por mim a culpar-me por "não estar a fazer nada", o que é perfeitamente imbecil. É preciso não fazer nada!

-Sinto vergonha alheia... de pessoas com falta de noção do seu privilégio e que, a par disso, acham que a meritocracia é o medidor de sucesso - ignorando, claro, que eles próprios começaram a corrida muitos metros à frente de vários outros concorrentes. Falta muita empatia pelo contexto social e pela taxa de esforço de cada um. Não nascemos todos no mesmo berço logo, não temos todos as mesmas oportunidades à partida.  

-O futuro...é um antro de ansiedades. Anda muita coisa a ser inventada e integrada nas nossas vidas com muito pouca ponderação, só porque supostamente "facilita a vida". Drones, CRISPR e Alexas deixam-me à beira de uma ataque de pânico, sinceramente.  

- Se eu encontrar... um gatinho na rua vou comunicar com ele, tentar estabelecer contacto e lidar com a rejeição 99% das vezes.

- Prometo... sair mais de casa para ir "beber café" com amigos. Juro, tem é de ser durante a tarde, ou podemos almoçar em vez de jantar. 

- Tenho orgulho... em ter crescido numa aldeia que me ensinou o valor de comunidade e partilha. Onde, conforme a altura do ano ouves frases como "Queres laranjas? Queres curgetes? Tenho lá tanta couve!". Agora que vivo na cidade, dou muito valor ao sistema de trocas de uma aldeia. É uma coisa tão natural e genuína e, apesar das intrigas do dia-a-dia, todos tomam conta uns dos outros de alguma maneira. É amor em verdura.