Viver
Surma: “Este álbum permitiu-me abrir uma parte de mim que, até hoje, nunca tive coragem de expor”
O segundo LP da artista de Leiria, Alla, é lançado esta sexta-feira, 11 de Novembro
Porquê cinco anos a separar este novo álbum [Alla, que é editado esta sexta-feira, 11 de Novembro] do álbum de estreia, Antwerpen, lançado em 2017?
Foi mais uma questão de falta de tempo do que propriamente um tempo pensado para tal. Desde 2017 que tenho tido a maior sorte do universo em tocar em sítios inacreditáveis por todo o mundo, poder trabalhar com teatro, moda, dança, cinema, artes plásticas, entre tantas outras áreas artísticas. Leva-me para outros horizontes em que me dá liberdade de poder criar tudo e mais alguma coisa. Quando nos deparámos com este infeliz acontecimento, da covid, permitiu-me tempo para voltar a estúdio e compor com a devida calma, com o conceito já pré-pensado, tanto visualmente como musicalmente.
Que diferenças existem entre a Surma de Antwerpen e a Surma de hoje?
Apesar de serem duas Surmas completamente distintas uma da outra, inspiram-se muito. Posso dizer que a Surma de Antwerpen deu a hipótese de a Surma de hoje ser muito mais madura e muito mais confiante naquilo que quer falar e no que quer dar às pessoas. Posso dizer que a Surma de hoje é mais vulnerável mas, ao mesmo tempo, com muito mais força do que a Surma de Antwerpen. O simples facto de ter conhecido tantas pessoas, culturas e ter explorado tantas áreas, estes anos, fez que com que crescesse muito a todos os níveis e a ver o mundo em determinadas perspectivas e não a fechar-me em mim.
Há um crescimento como pessoa e maturação enquanto artista que se reflectem nos novos temas?
Sem sombra de dúvida. Esta pausa deu-me o devido tempo para reflectir naquilo que gostaria de explorar enquanto temática e enquanto parte visual do álbum. Inspirei-me imenso em literatura, filmes e o simples facto de ter passado por variadas crises existenciais nesta pausa. Tive várias conversas comigo mesma, o que me fez abrir o espectro e interiorizar em mim várias problemáticas que tinha na minha cabeça por resolver e fez com que este álbum fosse a exteriorização disso mesmo. Este tempo de composição, solidão e de estúdio deu-me maturação e calma para poder maturar todo este caminho e todas estas questões que tinha na minha cabeça.
Quanto de autobiográfico existe neste disco?
Posso dizer que tem bastante. Vários temas que me dizem muito desde miúda. Inspirei-me muito no meu crescimento pessoal desde a minha infância até hoje. Posso dizer que este álbum me permitiu abrir uma parte de mim que, até hoje, nunca tive coragem de expor às pessoas. Quero que seja um álbum que coloque as pessoas num sítio confortável, que lhes traga o sentimento de casa e que não estão sozinhas no mundo para ultrapassar qualquer obstáculo que a vida nos propõe diariamente. Tudo tem o seu tempo e as coisas nunca acontecem por acaso. Todas as dificuldades que passamos dão-nos força e outra maneira de ver as coisas para ultrapassarmos situações futuras.
A identidade, a persona, o conceito que vão revelar-se nas actuações ao vivo: o que significam, que mensagem trazem?
Não posso revelar muito porque quero que seja uma surpresa. Mas posso dizer que vai ser uma live performance [ao vivo] muito diferente do Antwerpen. Já queria criar este conceito de persona e de cenografia live há imenso tempo. Estou a tentar recriar a atmosfera do álbum no espaço exterior em que o meu principal objectivo é levar as pessoas para o meu próprio universo e que entrem na minha própria bolha.
Que peso tem o Rui Gaspar na sonoridade do álbum?
Costumo dizer que o Rui é o irmão mais velho que nunca tive e acho que isso já diz muito do peso que o Rui tem, não só na sonoridade do álbum mas também na minha vida. O Rui é essencial para tudo isto acontecer, trabalhamos muito bem em equipa, temos uma química inexplicável. E não conseguia fazer metade de tudo isto sem ele ao meu lado. Não consigo descrever por palavras o que é trabalhar ao lado do Rui. É como se fôssemos uma só pessoa quando estamos os dois a trabalhar e a compor em estúdio. É uma ligação muito forte que temos um com o outro, puxamo-nos cada vez mais, não temos medo de quebrar barreiras e o que eu mais amo em trabalharmos juntos é que exploramos tudo e mais alguma coisa sem medos.
O desafio de redescobrir algo novo em cada momento de criação continua a parecer possível?
Nunca vai ser impossível. Temos possibilidades infinitas de explorar desde instrumentos a produção, a materiais, etc. Costumo dizer que o que me traz mais garra e felicidade de poder criar é saber que tenho uma equipa ao meu lado que não me diz que tenho de ser de um determinado género e que me dá liberdade, todos os dias, de tentar criar atmosferas e conceitos que nem eu mesma sei onde vão dar. Apoiam a minha visão, desde sempre. E se isso continuar, então vai ser sempre possível esse mesmo desafio de redescobrir tudo e mais alguma coisa.