Viver

Um corte de cabelo que mudou uma vida

31 dez 2015 00:00

Elisabete Maisão documenta quotidiano em todos os campos de refugiados europeus

Criança em Dunquerque (Foto: Elisabete Maisão)
Campo de Dunquerque (Foto: Elisabete Maisão)
Campo de Dunquerque (Foto: Elisabete Maisão)
Campo de Dunquerque (Foto: Elisabete Maisão)
A "Selva" de Calais (Foto: Elisabete Maisão)
A "Selva" de Calais (Foto: Elisabete Maisão)
A "Selva" de Calais (Foto: Elisabete Maisão)
Elisabete Maisão, ao centro, com um grupo de fotógrafos
Elisabete Maisão, ao centro, com um grupo de fotógrafos
Elisabete Maisão, ao centro, com um grupo de fotógrafos
Em Lesbos (Foto: Elisabete Maisão)
Em Lesbos (Foto: Elisabete Maisão)
Em Lesbos (Foto: Elisabete Maisão)
Projecto Haircult (Foto: Elisabete Maisão)
Projecto Haircult (Foto: Elisabete Maisão)
Projecto Haircult (Foto: Elisabete Maisão)
Jacinto Silva Duro

Tudo começou com uma ida, em Setembro, à antiga casa de Amesterdão para ir buscar as roupas de Inverno que lá havia deixado, antes de se mudar para o calor tropical do Rio de Janeiro.

Enquanto estava na capital dos Países Baixos, a fotógrafa Elisabete Maisão juntou-se a um grupo de cabeleireiros voluntários que costuma trabalhar na Milão Fashion Week e em Nova Iorque e que pretendia oferecer cortes de cabelo aos refugiados de Calais, aos campos da “Selva” - The Jungle, como é conhecido localmente - e ao de Dunquerque.

“A situação dos refugiados incomodava- me e eu tinha de fazer algo”, conta. Seria uma acção de apenas quatro dias, com o HairCult Project.Pode não parecer, mas aparência é uma coisa quase tão importante, quanto a comida e a roupa”, explica.

Durante os dias da missão aproveitaria para fotografar o quotidiano dos migrantes e recolheria histórias com vista a um trabalho editorial futuro… mas, ao fim do tempo previsto, decidiu ficar um mês e depois mais outro. Agora, em Dezembro, Elisabete Maisão está na ilha de Lesbos, onde chegam todos os dias entre 600 a mil refugiados.

A próxima paragem será Atenas e outro campo de refugiados. Desde há quatro meses, esta fotógrafa com ligações a Leiria já esteve em quase todos os campos de refugiados na Europa. Foi à Eslovénia, onde a proibição de fotografar a levou a ser “criativa” para conseguir captar imagens.

Esteve na Sérvia e na Alemanha, país que vai acolher um milhão de pessoas e que não tem um único campo de refugiados. Por um lado, razões históricas impedem que a opinião pública germânica admita a existência de locais onde pessoas são concentradas em grande número e por outro, a eficácia teutónica trata de dar casa e cuidados aos refugiados assim que estes chegam.

Agora Elisabete Maisão está na Grécia, a poucos quilómetros da costa turca. É ali que muitos botes de borracha, apinhados de gentes e sonhos, chegam todos os dias. A vida na “Selva” A “Selva” de Calais, diz, tem piores condições que os campos na Grécia. Lama, tendas, frio de rachar agora que o Inverno se instalou no centro da Europa, e como é um campo apenas com homens de várias nacionalidades e culturas, há muitos conflitos entre eles.

“Porque o Governo francês não o pediu, não há grandes organizações, como a Cruz Vermelha ou a Unicef, a trabalhar. Apenas pequenas ONG apoiam quem ali está. A de Elisabete tinha 12 pessoas em Setembro e agora conta já com quase 200 voluntários. Na viagem que a levou à Grécia, o responsável da ONG (Organização Não Governamental), a que a fotógrafa está afecta, ficou com a missão de escrever sobre a experiência e as histórias das pessoas e Elisabete de captar as imagens.

Esperam publicar a experiência em jornais e revistas e depois escrever um livro. “Temos muitas, muitas histórias, como a de pessoas que estão há dois anos em Calais sem perder a esperança de passar para o outro lado da Mancha, ou a emoção de ver os barcos chegarem, com 30 ou 40 pessoas, às praias”, conta, recordando ainda o relato de um jovem afegão que fugiu do seu país, quando os talibã o chamaram para combater.

“Enviaram-lhe uma notificação, que ele trouxe para pedir o estatuto de refugiado. Nela ameaçavam-no de morte e a toda a família. Mais tarde ouvi a mesma história várias vezes de outros jovens e todos trazem esses bilhetes.”

Uma ida a Amesterdão e uma missão
Nasceu em Lisboa, estudou na Escola Superior de Artes e Design de Caldas da Rainha e viveu durante alguns anos em Leiria onde esteve à frente de dois estúdios de fotografia: Miomi e Nouvelle Photo, onde, entre outras coisas, se dedicou à fotografia de produto. Participou também no livro Sensibilidades 25, com 25 outros fotógrafos do distrito.

Em 2008, mudou-se para Amesterdão e, quatro anos depois, partiu para o Rio de Janeiro. Em 2014, regressou a Lisboa e foi de lá que, em Setembro, partiu para ir buscar as suas roupas de Inverno à capital holandesa. A decisão haveria de a levar a todos os campos de refugiados da Europa.

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