Opinião
A lei da selva
Ultimamente, tem faltado a muitos “líderes” coragem para enfrentar aspirantes a ditadores
Volta e meia ouvimos uma expressão do género “aqui impera a lei da selva!”. A expressão apareceu pela primeira vez no final do século XIX n’ “O Livro da Selva” de Kipling. O livro que nos apresentou personagens como Mogli e Bagheera introduziu também esta “lei” que regia as relações entre os animais.
Com o tempo, a expressão passou a significar a superioridade da força bruta como argumento definitivo. A lei da selva funciona particularmente bem entre os animais da selva. Movidos unicamente pelo instinto de sobrevivência, o tigre procura caçar o veado e o mais forte dos dois sobrevive e prospera.
Mas, mesmo na selva, a lei não é de óbvio resultado. No embate entre o tigre e o veado, não há dúvida que o tigre é mais forte. Mas, o veado é rápido, perspicaz, e vive em comunidade que visa a proteção do coletivo. Nos humanos, também os mais fortes não são imbatíveis: a inteligência, a resiliência, e a capacidade de usar um número grande de pessoas menos poderosas conseguem equilibrar a contenda. É, contudo, necessário que as pessoas aparentemente menos poderosas possam ser lideradas por alguém que demonstre coragem.
Ultimamente, tem faltado a muitos “líderes” coragem para enfrentar aspirantes a ditadores. Os EUA mostram como diversos líderes (políticos, económicos, e judiciais) preferem ser colaboracionistas – uns por convicção, outros por receio de perder (dinheiro, emprego, influência). Também em Portugal têm aparecido os colaboracionistas que querem aplicar a lei da selva. Há os convictos, como os defensores de genocidas ou os que recusam os limites da constituição no tratamento dos direitos dos cidadãos. E há também os colaboracionistas cobardes, que se recusam a fazer frente aos supostamente poderosos porque parece estar na moda.
Sobretudo, a lei da selva aplicada à humanidade só tem sucesso quando a inteligência e a racionalidade abandonam a arena, substituídas pelo instinto e pelas emoções primárias. Quando triunfa o individualismo (aparente e enganador!) em detrimento da natureza gregária que permitiu ao Ser Humano ser o animal mais bem-sucedido da História recente da Terra. Quando as regras e as leis são abandonadas e não defendidas.
Estando em época de escolhas eleitorais, gostaria que os candidatos demonstrassem inteligência, racionalidade, e coragem. Que mostrassem forma de liderar as pessoas (cada uma com pouco poder) de forma transformadora. Que não fossem colaboracionistas, aliados de tigres de papel – fortes apenas com os fracos. Tenho visto muito poucos assim.
Texto escrito segundo as regras do Novo Acordo Ortográfico de 1990