Opinião
Amor não rima com Dor
Não quero culpar só a forma como apresentamos o amor na televisão ou cinema, mas sim enquanto sociedade
O Dia dos Namorados celebrou-se este mês e apesar de todo o aparato mais comercial à volta desta efeméride, a comunicação social (e bem!) voltou a falar dos números assustadores de violência nas relações íntimas, especialmente no namoro da adolescência. Ora vamos a números.
O Estudo Nacional sobre a Violência no Namoro de 2024 da Associação UMAR reporta que dos inquiridos 68,1% não considera violência pelo menos um dos 15 comportamentos descritos no estudo, sendo que a mesma pessoa legitima vários deles!
Destes destaco: o controlo do outro, violência psicológica, perseguição, violência sexual, perseguição nas redes e violência física. Sem querer ser exaustiva, estes estudos que regularmente são publicados mostram uma realidade cada vez mais preocupante. E não deixo de reflectir: que concepções de amor estamos a mostrar aos adolescentes para eles acharem que amor rima com dor?
Este ideal de amor como posse do outro, onde expressões exageradas de ciúme são sinal da força do amor, assim como uma visão de que o outro deve estar à nossa imagem, sendo que amar deve ser a fusão de duas pessoas. Será mesmo? Não quero culpar só a forma como apresentamos o amor na televisão ou cinema, mas sim enquanto sociedade.
Embora também alguns investigadores apontem o dedo à indústria pornográfica, a grande educadora sexual dos nossos tempos, que apresenta uma visão machista e misógina do sexo. Seja o que for, a mensagem está a passar de forma errada! Quando em terapia de casal existem um claro desequilíbrio de poder na relação amorosa, não há condições de realizar terapia enquanto esse equilíbrio não for restabelecido. Em situações de violência clara, é impensável.
E os pequenos comportamentos que os membros do casal legitimam e até apresentam como a sua bandeira de honra? Como por exemplo ter acesso ao telemóvel do outro e poder ler as mensagens privadas? No caso dos adolescentes, na maior parte das vezes temos a agravante das redes socais. Então e ter vídeos íntimos de alguém e colocar nas redes para humilhar propositadamente? E tudo o que daí advém como bem sabemos. O isolamento das vítimas, os quadros depressivos, assustadoramente acompanhados de auto-mutilação, o baixo rendimento escolar e o abandono, etc.
O nosso trabalho muitas vezes é educativo. Trazer para luz como esses comportamentos são destrutivos e pouco saudáveis. Seja em terapia de casal, seja na intervenção com adolescentes. E tudo isso começa em casa também.