Opinião

Crónica dos dias feios

7 nov 2025 16:15

Há quem cuide, quem se preocupe, quem dê sem pedir nada em troca

Às vezes não sei que voltas dar à caneta, ou ao teclado melhor dizendo. Nada me apraz e me entusiasma. Do que vou eu falar desta vez?
Temas não me faltam, mas a vontade de lhes tocar é pouca, ainda que presos na garganta.

Nunca escrevi sobre Gaza, por exemplo, e não é desta que o vou fazer. Tudo o que dissesse soaria a revolta e perplexidade. Como é possível uma barbárie destas ser contemporânea connosco? 

Também não vou falar de política nacional nem do circo parlamentar onde, cada vez mais, se sentam figuras que confundem protagonismo com liderança (não lhes chamarei palhaços porque ser palhaço exige uma poderosa regulação emocional e uma boa dose de empatia). No fundo, cabeças pequeninas cheias de fronteiras limitadoras e incendiárias, que preferem a crítica, o ataque, o ruído, à construção de alternativas e soluções.

Escrever sobre a solidão a que estão entregues muitos idosos seria um desafio demasiado doloroso. Chegar ao fim da linha desamparado e esquecido é morrer em vida, na verdade.  Saber ainda que alguns são vítimas de violência praticada pelos próprios filhos é então insuportável. 

Há também a falta de urgência das urgências hospitalares e o temor constante de vir a precisar de ajuda e não a encontrar. Enfim, a saúde, o nosso bem mais precioso, ao Deus dará. 

Depois há aquele bebé grande, birrento, prepotente e sem noção que me encoleriza assim que abre a boca. Aquele que queria um prémio Nobel e que ameaça a democracia todos os dias. 

Há ainda o tempo que corre ao meu lado e que faz a vida avançar depressa demais. Há o inevitável, o que foge ao controlo e um longe quase aí. 
Às vezes, como diz Rui Veloso na canção, tudo à volta é tão feio.

Desculpem hoje o meu desencanto, eu sei que a vida é muito mais que este punhado de queixumes. Há quem cuide, quem se preocupe, quem dê sem pedir nada em troca. Há corações no sítio deles e há esperança, mas pôr em palavras as emoções que absorvemos diariamente é um exercício e peras. 

Um psicólogo não é de ferro!