Abertura
Profissão? Presidente de Junta, padre, psicólogo, engenheiro, assistente social...
De todos os cargos políticos, o presidente de Junta é porventura aquele que maior envolvimento estabelece com a comunidade. E são tantas as competências exigidas, que nem sete ofícios bastam para o caracterizar
Dia 28 de Janeiro de 2013 foi publicada em Diário da República a lei da Reorganização Administrativa do Território, que veio agregar muitas freguesias que, até aí, eram geridas de forma autónoma. Volvidos sete anos, o JORNAL DE LEIRIA acompanhou no terreno o trabalho desenvolvido por dois presidentes cujos territórios foram transformados por esta agregação.
Quer no caso da união de freguesias mais populosa do distrito de Leiria, quer no caso de uma das mais pequenas uniões da região, há uma marca comum. As solicitações de um presidente de Junta são tantas e tão diversificadas que, além das competências políticas, há outros talentos, quase imperativos, a cultivar. A rotina diária exige dos autarcas os sábios conselhos de um psicólogo, as medições exactas de um engenheiro, a caridade de um padre, a paciência de um santo... e até a ubiquidade de um deus.
Um dia com mais de 24 horas
São 9 da manhã e não é por ser sexta- feita que abranda a rotina do senhor presidente da União de Freguesias de Leiria, Pousos, Barreira e Cortes. Sentado à secretária, na sede da Junta de Leiria, às primeiras horas da manhã José Cunha tem uma série de documentos para assinar. O autarca é natural da Barreira, tem 59 anos e já cumpriu metade do segundo mandato nesta união de freguesias, que é a mais populosa do distrito. No total, são mais de 25 mil habitantes a residir num território heterogéneo. Felizmente, conta José Cunha, os filhos estão criados e a esposa é muito compreensiva com esta sua ocupação tão exigente.
A sua experiência política anterior tinha sido como presidente da Junta da Barreira. Barreira, apenas e só. Contabilista de formação, José Cunha facilmente conciliava a sua actividade profissional com a presidência daquela Junta. Não só pela ligação familiar à terra, mas também pela dimensão da freguesia, era mais fácil reconhecer as pessoas, de quem José Cunha sabia as alcunhas, os parentes, as necessidades. Essa experiência de grande proximidade contrasta com a realidade que vive hoje.
Leiria é uma urbe, onde vive e trabalha muita gente. Gente de mais de 30 nacionalidades, estima o presidente. Por essa razão, é impossível conhecer todos os ‘fregueses’. Citadina e cosmopolita, a sede da Junta de Leiria é um constante entra e sai de pessoas que precisam de atestados de residência, por causa dos seus compromissos com o Serviços de Estrangeiros e Fronteiras. Além de Leiria, há também que cuidar de Pousos, Barreira e Cortes, onde as pessoas apresentam as necessidades de territórios semi-urbanos, com alguns traços de ruralidade, refere o presidente. Antes da Reorganização Administrativa do Território, quandosó presidia a Junta da Barreira, bastava a terça-feira para se reunir com o restante executivo e fazer atendimento ao público, recorda o autarca.
Hoje a vida do presidente da União de Freguesias de Leiria, Pousos, Barreira e Cortes é mais do que um trabalho a tempo inteiro. “Costumo dizer que trabalhamos 24 horas por dia. E quando 24 horas por dia não chegam, também trabalhamos de noite”, brinca José Cunha. O telemóvel está sempre ligado. Quanto muito, tira-se o som. Até porque, além de presidente da União de Freguesias, José Cunha integra o Conselho Municipal de Segurança e nunca se sabe quando é preciso agir também nesse campo. “Há quem se queixe que estou todo o dia ao telefone”, brinca o autarca, que durante os primeiros 30 minutos de entrevista interrompeu a conversa duas vezes, precisamente para atender o telemóvel. “Não, não me esqueci. Eu passo aí”, responde o autarca às vozes que se inquietam do outro lado da linha.
E que lhe pedem os ‘fregueses’? Um pouco de tudo, relata o presidente. “Quando começamos a fazer obras, já sei que vou receber uma série de gente a falar de problemas. Porque com os trabalhos a água está a escorrer para dentro de casa, porque o buraco da obra foi feito à porta de casa e agora é mais difícil entrar...”. Reclamam do buraco na estrada, da falta de iluminação na rua, “servem-se da Junta e da figura do presidente de Junta para a resolução dos seus problemas. Até de conflitos com vizinhos: é o cão que faz barulho, o galo que acorda as pessoas durante a noite ou as árvores dos outros que têm galhos a cair sobre o seu quintal”, relata o autarca. “Mas também recebemos elogios”, realça José Cunha.
“Costumo dizer que precisava de tirar formação ao nível da Psicologia e da Psiquiatria. Porque eu oiço as pessoas, só não tenho autorização para passar as receitas”, brinca o presidente. “Assim como também oiço muita confissão. Só não posso dar absolvição.” Há ainda quem se dirija à Junta para pedir trabalho. E até para pedir mais do que isso: “Quando antecipadamente referem que o assunto a tratar é particular, já sei que vêm para pedir dinheiro”, expõe o autarca. Nesse caso, “encaminhamos a pessoa para a assistente social, para a Câmara ou para a Cáritas”, explica o presidente.
“O elo mais baixo da cadeia alimentar”
“Somos o elo mais baixo da cadeia alimentar do Estado”, afirma José Cunha. A metáfora aplica-se ao órgão que está mais próximo da população, mas que, sendo também ele Estado, não deixa de estar sujeito a grande carga burocrática.
“Há muitas coisinhas que, se dependessem só de nós, já estavam resolvidas. Mas há muita burocracia”, observa o presidente. Sejam as leis que se aplicam à Junta em si, sejam as leis que tutelam a relação desta com a Câmara ou com
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