Sociedade
Um rap sobre Saramago e os primeiros livros de um novo clube de leitura na prisão
Reclusos do Estabelecimento Prisional de Leiria – Jovens vão receber livros novos e conversar acerca deles uma vez por mês. Esta terça-feira, apresentaram um rap sobre José Saramago na inauguração de uma exposição dedicada ao Nobel da Literatura
Diogo, 22 anos, é o primeiro leitor do projecto Janelas para o Mundo, lançado esta terça-feira, que leva livros da Biblioteca Municipal Afonso Lopes Vieira ao Estabelecimento Prisional de Leiria – Jovens (EPL-J) e prevê tertúlias com os reclusos, uma vez por mês, no formato clube de leitura.
Na primeira requisição, Diogo escolhe uma biografia de Nelson Mandela, disponível numa banca com obras de José Saramago, romances de Mark Twain e José Luís Peixoto, mas, também o Livro de Recordes do Guiness, a História da Europa para Pessoas com Pressa e aventuras de Astérix, Tintim e Harry Potter.
Na mesma cerimónia, jovens do EPL-J interpretam em modo rap a letra e a música de homenagem que escreveram sobre José Saramago, para assinalar o centenário do nascimento do escritor, no âmbito da exposição Voltar aos Passos que Foram Dados, inaugurada esta manhã na tanoaria da prisão e dedicada ao único português Nobel da Literatura.
“Nome dele é José / amado pelo povo / vida cruel, ele é um lutador / homem bondoso, mas também, conhecedor / com poucos anos sabia o que era a dor / cabeça erguida, a luta está vencida”, destacam numa passagem do texto.
E o refrão: “Sou o José da Azinhaga / e esta é a minha caminhada / antes eu não tinha nada / Portugal à minha obra deu valor, o que eu fiz com tanto amor”.
Outro jovem do EPL-J lê um excerto do romance Memorial do Convento e a professora Isabel Silva dá uma pequena aula para duas dezenas de reclusos, sobre a vida e a produção literária de José Saramago, em que partilha frases do escritor capazes de inspirar esperança. Por exemplo, “o que as vitórias têm de mau é que não são definitivas. O que as derrotas têm de bom é que também não são definitivas”, e também, “sempre chegamos ao sítio aonde nos esperam”.
O tom motivacional e de sensibilização para a leitura mantém-se na apresentação do projecto Janelas para o Mundo, quando a bibliotecária Ângela Pereira, da Biblioteca Municipal Afonso Lopes Vieira (BMALV), dá voz a Nelson Mandela – “a cela é o lugar ideal para conhecermos a nós próprios” – e destaca os direitos inalienáveis do leitor conforme estabelecidos por Daniel Pennac, que incluem saltar páginas ou reler.
Entretanto, a selecção de livros deixada pela BMALV no EPL-J já tem um guardião – um dos jovens fica responsável pela biblioteca.
“Tudo o que é desenvolvimento da leitura é desenvolvimento pessoal” e “de competências” que “prepara” para a saída em liberdade, comenta a directora do estabelecimento prisional, Joana Patuleia, que acredita que o projecto Janelas para o Mundo “irá dar frutos”.
A colaboração entre o EPL-J e a BMALV, segundo Anabela Graça, vereadora da Cultura na Câmara de Leiria, dá aos reclusos a oportunidade de “construir interiormente um mundo melhor” e de “conquistar o mundo através do livro”, numa iniciativa que pode ser “uma janela para o futuro” e permitir que “a partir da leitura se tornem melhores pessoas”.
Organizada pela BMALV em parceria com a Fundação José Saramago, a exposição Voltar aos Passos que Foram Dados – José Saramago 1922-2022 encerra as comemorações em Leiria do centenário do nascimento do escritor.
Inclui 15 painéis, com selecção e composição de textos de Fernanda Costa e design de André Letria, dos primeiros anos de escola até à consagração de Saramago como escritor universal.