Sociedade
Prospecções de argila em Ansião e Alvaiázere preocupam população
Argila vermelha é usada como pigmento da pasta para pavimentos
Duas comunidades de Ansião e Alvaiázere não estão satisfeitas com o anúncio de que, junto aos seus lares, possa vir a ser instalada pelo menos uma área de extracção de argila vermelha (argilas especiais e areias siliciosas).
Foi quase por acidente que perceberam que, nos editais afixados nas sedes das juntas de freguesia e no portal Participa se dá conta de que a Aldeia SA, empresa de Leiria, pretende fazer prospecção junto à localidade de Murtal, na freguesia de Almoster (Alvaiázere), e em Pessegueiro, na freguesia de Pousaflores (Ansião).
As áreas são quase contíguas.
Segundo Luís Lopes, administrador da Aldeia SA, o processo está ainda numa fase inicial e, caso se decida avançar com a exploração, após a prospecção, que ainda não foi autorizada pela Direcção-Geral da Energia e Geologia, “a área intervencionada implicará 30% da zona agora delineada”.
O responsável pede “bom-senso” e explica que, “tanto para a população e para as autarquias, saber o que há no subsolo não traz problemas a ninguém”.
A argila vermelha é usada como pigmento da pasta para pavimentos, segundo fonte da empresa, que esteve presente em duas sessões de esclarecimentos à população.
Contudo, tanto os residentes portugueses, como a comunidade de estrangeiros, maioritariamente reformados ingleses e norte-americanos, perante a perspectiva de verem desaparecer o sossego e parte da paisagem e de lidar com ruído, pó e, nalguns casos, a inviabilização de projectos de ecoturismo, estão a ponderar partir.
“Há quem esteja a pensar vender e ir embora de Portugal”, diz Gwen van Boom, que se instalou na freguesia de Pousaflores com o marido em 2022, após ter vendido a casa na Bélgica e de ter passado dois anos à procura de um novo local para criar um lar.
“Temos seis mil metros quadrados a três quilómetros de Ansião e estamos rodeados de floresta", conta.
O casal descobriu o que se estava a passar, por intermédio de amigos.
“Não veio nada no jornal local, onde há notícias das festas e eventos da terra. Só foi anunciado na junta e na câmara. Nem os nossos vizinhos portugueses sabiam”, recorda.
Levou a família toda a uma concorrida reunião em São João de Brito onde a junta de freguesia prometeu um relatório negativo no portal Participa.
Foi criada ainda a página “Pessegueiro - Não à prospecção, pesquisa e exploração”, no Facebook, e os moradores das localidades afectadas em ambos os concelhos estão a promover o abaixo-assinado "Todos por Almoster, Todos por Pousaflores", com recolha de assinaturas online e porta-a-porta, uma vez que a generalidade da população não tem acesso à internet.
“Já temos 400 assinaturas em papel e 1238 online”, conta João Marques.
O jovem, morador em Almoster, explica que a Aldeia SA prometeu a criação de quatro postos de trabalho, mas que o território, castigado pelo despovoamento, não vê nisso “quaisquer benefícios”.
No Murtal, a área que poderá servir para exploração tem como limite a zona limítrofe do rio Nabão e que recebe, anualmente, um número cada vez maior de peregrinos nacionais e estrangeiros, por ali passar o Caminho Português de Santiago.
João Marques recorda que, nos anos 70 e 80 do século passado, uma exploração deste tipo, na zona, trouxe consequências para o modo de vida de parte da população, que viu os campos a jusante serem engolidos pela lama e barro. “Ficaram destruídos pelas enxurradas”, explica.