Editorial
(De) Quem (se) defende o Ministério Público?
Na Comarca de Leiria, a falta de Oficiais de Justiça no Ministério Público obrigou à recolocação de funcionários em seis tribunais para assegurar o funcionamento dos serviços
Há uns anos, o País andou vários meses em sobressalto, por causa de uma alegada vírgula que um ministro terá mandado colocar num decreto-lei, a troco de 120 mil contos. Nos últimos meses, o sobressalto instalou-se nos meios políticos e judiciais, por causa de um parágrafo. Meia dúzia de li-nhas que levaram à demissão de um ministro e à queda do Governo.
Em 1993, foi instaurada uma Comissão Parlamentar de Inquérito. Agora, foi pedida a presença da Procuradora-Geral da República perante os deputados. Mas se há 30 anos não se retiraram grandes conclusões, provavelmente, o mais certo é que, também agora, a audição se traduza em respostas vagas e inconsequentes. Na melhor das hipóteses, a verdadeira essência do conteúdo do dito parágrafo só será esclarecida com o desfecho do processo que lhe deu origem. Seja por julgamento ou arquivamento.
Entretanto, é o Ministério Público (MP), enquanto instituição responsável pela defesa do Estado e da legalidade democrática, o alvo de (quase) todas as críticas. Curiosamente, ou talvez não, muitas destas críticas têm vindo da classe política, a quem cabe elaborar as leis pelas quais têm de se reger os magistrados do MP.
Para agudizar os ânimos, esta semana, a Procuradora-Geral da República veio falar numa “campanha orquestrada” para denegrir a sua imagem e, consequentemente, a imagem do Ministério Público. Dias antes, tinha sido a ministra da Justiça a admitir uma “certa descredibilização” da instituição e a defender que terá de ser o (ou a) sucessor(a) de Lucília Gago a “pôr ordem na casa”.
Ora se consultarmos o último relatório anual de actividades da Comarca de Leiria, verificamos, por exemplo, que o quadro de Oficiais de Justiça da carreira do MP apresenta “um déficit de 24%” e que, “para manter em funcionamento algumas secretarias dos serviços do MP, foi necessário recolo-car funcionários da carreira judicial” em tribunais de seis concelhos do distrito.
O documento alerta ainda, entre outras coisas, para a forma arcaica como se processa o tratamento de bens apreendidos: “Os objectos são descritos (uma, duas e três vezes) nos Órgãos de Polícia Criminal, novamente no Ministério Público e, nalguns casos, mais uma vez quando o processo ingressa na parte judicial, praticamente nada se aproveitando de uma fase para a outra”.
Independentemente de quem tenha razão nesta troca de ‘galhardetes’ institucional, um facto parece claro: é mesmo preciso “pôr ordem na casa”.