Entrevista

Luciano de Almeida: “A reforma do ensino superior tem de se centrar nos estudantes”

28 set 2023 10:34

Antigo presidente do Politécnico de Leiria, que se jubilou na semana passada, defende que as instituições devem aproveita a experiência de ensino à distância para "chegar aos alunos que não se podem deslocar para onde um quarto custa 400, 500 ou 600 euros".

Maria Anabela Silva

Proferiu, na semana passada, a sua última aula. O que sentiu?
Foi um momento que considero importante e simbólico na medida em que assinala um percurso de 34 anos de docência e de 33 anos no Politécnico de Leiria.

De todos os cargos e funções que desempenhou, o que mais o preencheu?
Há dois marcos importantes, no Politécnico de Leiria e no ensino superior português. Um foi a implementação dos programas de qualificação do corpo docente, que se revelou um momento de viragem no instituto. Num espaço de tempo muito curto deu-se um grande salto qualitativo. Sinto-me muito grato pelo corpo docente ter acreditado que isso era possível, mesmo à custa de enorme sacrifício e dedicação. Do meu percurso no Politécnico, o mais importante foi o sucesso destes programas. Com as mesmas pessoas a instituição mudou, em termos de qualidade do ensino e da investigação. O segundo momento marcante foi a reforma do ensino superior, iniciada com a ministra Maria da Graça Carvalho e continuada com o professor Mariano Gago. Destaco a adaptação ao processo de Bolonha, que foi bem sucedida, e a aprovação do estatuto da carreira docente do ensino superior politécnico. Graças à qualificação que adquiriram os professores passaram a ter vínculo à instituição.

O objectivo de ver o Politécnico a conferir o grau de doutoramento não foi alcançado na sua liderança, mas a porta está agora aberta. Por que demorou tanto tempo?
Sempre disse que a possibilidade de conferir o grau de doutor e a transformação em universidade não pode depender de uma simples alteração legislativa. Primeiro, era preciso criar as condições necessárias e adquirir as competências científicas e pedagógicas indispensáveis à outorga daquele grau para exigir essa competência. A qualificação do corpo docente era indispensável. Fizemos o percurso certo. Mas, entre o momento em que se criaram as condições e se conseguiu aprovação [para conferir doutoramentos], decorreu muito tempo, mais do que o necessário.

Que explicação encontra para esse protelar?
Em 1969, os professores Miller Guerra e Sedas Nunes, a propósito da reforma das faculdades de medicina, escreveram um artigo onde concluíam que as universidades eram incapazes de se auto-reformar. Em 1970, quando o professor Veiga Simão tomou posse como ministro da Educação disse o mesmo e acrescentou uma coisa com a qual não concordo: que na altura as universidades só formavam professores do ensino secundário e mal. Em 2006, Mariano Gago, a propósito da reacção das universidades ao projecto de reforma do Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior [RJIE], declarou que não se conformava com a mediocridade do ensino superior português.

O que dizer com estas referências?
Os professores do ensino superior são dos grupos profissionais mais conservadores, em particular os das universidades. Na discussão em torno da Lei que veio permitir aos politécnicos conferir o grau de doutor usaram os mesmos argumentos utilizados quando os institutos passaram a ter licenciaturas e mestrados. A aprovação da Lei foi um grande passo, mas vem aí a avaliação e revisão do RJIES. É preciso estar muito atento, porque as mesmas forças irão procurar agora dar passos atrás.

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