Opinião

Não passaram

6 ago 2023 09:21

Não tardaram a censurar peças de teatro e filmes, a arrancar símbolos LGBTIQ+ do espaço público, ou a proibir livros infantis escritos em catalão

Um dia depois de conhecidos os resultados das Eleições Legislativas antecipadas espanholas, escrevo estas linhas já imbuído de um reconfortante sentimento de alegria e alívio.

Um contraste absoluto com a ansiedade e o medo que, tanto eu como muitos dos que por aqui me rodeiam, fomos incapazes de evitar nos últimos dois meses.

Sabemos que o travão imposto à extrema-direita neste 23 de Julho, de definitivo não tem nada.

Mas também sabemos que, pelo menos, ainda há uma maioria de cidadãos que não admite o retrocesso civilizacional que nos queria impor a sinistra extrema-direita, de mão dada com a pérfida direita dita tradicional.

Foi por pouco, mas não passaram.

Como diz Javier Crudo, editor do recomendável programa de rádio e podcast Carne Cruda, “foi preciso vermos as orelhas ao lobo”.

Foi preciso que um partido fascista, levado ao colo por um outro partido com demasiadas saudades de outros tempos (e que cada vez menos as consegue esconder), chegasse ao governo em municípios e comunidades autónomas, para que muitos percebessem o que está verdadeiramente em jogo.

Foi preciso que, em apenas dois meses de poder, colocassem em prática uma ínfima parte do que prometem à boca cheia, para que outros tantos entendessem que esta gente está mesmo a falar a sério.

Negam as alterações climáticas, mas deram-lhes cargos na área da agricultura e meio ambiente.

Sabemos que o travão imposto à extrema-direita neste 23 de Julho, de definitivo não tem nada
Sérgio Felizardo

Odeiam a diversidade social, cultural, sexual e de género, mas deram-lhes responsabilidades na área da cultura.

Não tardaram a censurar peças de teatro e filmes, a arrancar símbolos LGBTIQ+ do espaço público, ou a proibir livros infantis escritos em catalão em bibliotecas.

Foi preciso rirem-se descaradamente durante um minuto de silêncio dedicado a uma vítima da violência machista que, em Espanha, entre Janeiro e Junho de 2023, já custou a vida a 28 mulheres.

É chocante, mas não espanta.

Ao progresso, à conquista de direitos e ao futuro, respondem sempre com retrocesso, violência e passado.

Não passaram, mas, aqui como aí, vão continuar a tentar furar, corroer, desgastar.

Estejamos, pois, preparados para os travar. Sempre!