Desporto
Uma voltinha pela Curvachia com o mágico Zé Agostinho
Se há alguém que não precisa de GPS para não se perder na mata da Curvachia, esse alguém é Zé Agostinho. Fomos conhecer o homem que mais cuida do segredo mais bem escondido de Leiria e arredores.
Há três anos, a vida mudou radicalmente para Zé Agostinho. Com o desemprego e a reforma antecipada, a disponibilidade financeira diminuiu, na justa proporção que aumentou o tempo livre. “Acabou-se o emprego, acabou-se o dinheiro, acabaram-se as competições.”
Atleta há três décadas e meia e com quase quatro dezenas de maratonas no palmarés, teve de deixar de se inscrever em provas, mas encontrou o escape perfeito na mata da Curvachia, a poucas centenas de metros de sua casa, no Vidigal. É lá que se sente feliz, seja a treinar ou a conservar e a inventar trilhos para praticar a sua grande paixão.
Falaram-nos tanto do Zé que tivemos de ir conhecê-lo. Depois de combinar a visita, surgiu no local de encontro, às portas da Curvachia, de sapatilhas, calções, um relógio com GPS e uma mochila às costas.
Tem 60 anos e a disponibilidade de um indivíduo com metade da idade. Irradia saúde e mantém o sorriso na cara. “Se quiserem arranhar um bocadinho os braços eu ponho-vos no meio do mato para perceberem o que é virgindade da Curvachia.” Pedimos ajuda divina e lá fomos nós.
Não há dia em que Zé Agostinho não passe várias horas na mata. Seja no seu treino diário, seja a preparar trilhos para usufruto próprio e dos grupos que com ele vão ter. Por norma serve de guia, mas até pontes faz, com madeira cedida pela Câmara Municipal de Leiria, para que as senhoras das caminhadas organizadas pela autarquia não molhem os pés.
Na última terça-feira de cada mês, por exemplo, é o pessoal do 'treino do cacete' que se junta a ele. Chamam-lhe 'o mágico da mágica Curvachia'.
Zé Agostinho aceitou dar-nos a conhecer os segredos mais bem escondidos do segredo mais bem escondido da região. Ele, que frequenta o local há mais de trinta anos, admite que ainda não sabe tudo e é frequentemente surpreendido com novas descobertas.
“No início perdia-me um bocado e nos cruzamentos punha um raminho de árvore para saber a direcção”, recorda. No Verão, a mata ganha muitas silvas e para que tudo continuasse operacional decidiu começar a dar um jeito. “No dia seguinte a um treino mais difícil, o corpo não tem reacção para correr. Pego numa tesourinha e 'tuca'. Mais uma corridinhas e 'tuca'. E assim se passa o tempo e se vai recuperando.”
Aquela mata, a pouco mais de cinco quilómetros do centro de Leiria, é um daqueles segredos fechados a sete chaves. “Ainda bem”, diz-nos quem dela usufrui. Situada entre as freguesias de Pousos e Arrabal, esta mancha florestal conserva imensas espécies autóctones, com destaque para os carvalhos e os sobreiros.
Quem quiser saber como era a floresta portuguesa no início do século XX, tem mesmo de conhecer esta mata. E quem quiser um espaço único para praticar exercício, não pode perder a oportunidade de lá ir. Mas, cuidado! É tão fácil ficar deslumbrado quanto perder-se.
“É um escape”, admite. “Se ficasse em casa estava no sofá, ia comendo, ia bebendo e começava a engordar. Não, vou para a Curvachia!” Corre e, se não lhe apetece correr, leva a mochila com uns objectos para tratar de pôr tudo nos trinques. Foi o que fez connosco. Abriu a mochila e tirou a tesoura.
Enquanto nos mostrava os caminhos, lá ia cortando os ramos que começavam a importunar a passagem. O trabalho parece feito por máquinas. “Nada disso”, contrapõe. “Como corro aqui praticamente todos os dias, gosto de vê-los limpos”, explica. Habitualmente aproveita trilhos abertos por javalis. “Eles limpam por baixo e eu concluo o trabalho por cima.”
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