Opinião
Escolher com critério
A opção pelo voto “branco” é participação ativa e não abstenção e, se fosse, como devia, tido em conta, forçaria propostas e sistema eleitoral diferentes
Meu Caro Zé,
Já não vamos ter outra conversa antes de um tal dia 10 de março, dia em que continuam a dizer que se escolhe um primeiro-ministro para Portugal. Acresce que continua a conversa “esquerda/direita” e eu tenho cada vez mais dificuldade em lidar com isso, até porque verifico que o ditado popular “os extremos tocam-se” tende a verificar-se cada vez mais, transformando o “hemiciclo” num “ciclo”, atentas as propostas de partidos considerados “extremistas”.
Neste contexto, vale a pena citar uma cronista que no Público (07-02-2024) escrevia: “Temos como garantia que nenhum voto à esquerda será um voto perdido para impedir a direita de chegar ao poder”. Logo, só há esquerda e direita e o objetivo primeiro é “impedir” o lado contrário e não construir algo. Só que, no mesmo artigo, a cronista escreve: “Até consigo reconhecer virtudes na alternância entre centro-esquerda e o centro-direita, que marcou a história da nossa democracia…”
Mas então há “centro”! Onde está ele? Até tem direita e esquerda e, portanto, não é uma linha, mas um espaço maior ou menor. Ainda por cima se lhe reconhece méritos! Então que sentido faz essa linha radical entre esquerda e direita? O que é uma escolha ao centro? Não é possível? Mas o que é uma escolha? Quando se tem o “cardápio”, se houver algo que é para nós ótimo, a escolha é fácil. Mas a realidade mostra que, na generalidade, todas as escolhas têm restrições. Como dizem os economistas: “Não há almoços grátis”.
Quando assim é, em economia passa a escolher-se o “second best”, em inglês! A tradução portuguesa será “o segundo-melhor”. Curiosamente os franceses designam essa situação por “le moindre mal” (o mal menor). Estás mesmo a ver Zé, pelo que tenho escrito, que esta segunda fórmula traduz bem o que aqui vai. Ora, as restrições esquerda e direita matam a hipótese de centro, muito mais quando se confunde “apoiar” com “não se opor”.
Quando há uma lógica de bem comum, as restrições individuais ou partidárias implicam levar isso em conta. Perante isto, meu caro Zé, vou continuar no francês com o aforismo: “Les absents ont toujours tort” (os ausentes nunca têm razão). A opção pelo voto “branco” é participação ativa e não abstenção e, se fosse, como devia, tido em conta, forçaria propostas e sistema eleitoral diferentes. Mas, como nesta escolha ainda não há qualquer efeito, há que escolher, nem que seja o “menos mau”. Com que critérios? Aí cabe a cada um de nós, finalmente, ter escolha.
Até sempre,