Opinião
Um País em forma de assim-assim
Como noutras áreas essenciais da sociedade, em política, quem se notabiliza e faz jus ao encargo, são os líderes com dotes de humanismo e competência
Alexandre O’Neill em 1958, no poema «Um Adeus Português», imortalizou a “alegria sonâmbula” do “modo funcionário de viver” que a “roda de náusea em que giramos / até à idiotia / esta pequena morte (…) / nossa razão absurda de ser” nos coagem ao “dia burocrático”. Redijo este texto incitado pelo sentimento insanável que emerge no presente, acorrentando o nosso futuro ao desgoverno, quando há dias celebrámos 51 anos de democracia portuguesa.
O desânimo que se vive é equivalente ao da implosão da ‘casa’ onde nascemos e crescemos, detonada pelos «convencidos da vida» a que também aludiu O’Neill. Prevalece a sensação de vazio e o marasmo, rito desgostoso de frivolidades e conformismos, no país que é cenário de quezílias e boçalidades. Retornemos ao olhar do poeta surrealista, porque «Há idiotas que se consideram inteligentíssimos, o que é uma forma muito comum de idiotia, e extraem dessa certeza alguma felicidade, (…) que consiste em uma pessoa se julgar muito superior às que a rodeiam».
No pó da zombaria de campanha e nas difusas referências à portugalidade (éticas, ideológicas, socioculturais e cívicas), face aos interesses que não sejam os da «ganhunça», somos alienados na pequenez da demagogia e da ficção eleitoral. Eça de Queiroz já traçava o fio do lusitano progresso na «choldra ignóbil», que apregoavam os deputados de então, tal como os de agora, vivamente saracoteando «um brilho de lantejoulas», infundindo promessas ao invés de compromissos, espoliando o futuro.
Como noutras áreas essenciais da sociedade, em política, quem se notabiliza e faz jus ao encargo, são os líderes com dotes de humanismo e competência. Um ano após o último sufrágio, os novos gastos em campanha eleitoral são conhecidos - no total, os partidos estimam gastar 8,45 milhões de euros. E os programas eleitorais são formalidades que ninguém leva a sério (partindo da hipótese, improvável, de que alguém os leia). São meros exercícios de ficção eleitoralista, isto é, a mediania do ‘mais do mesmo’.
A vida partidária há muito que se tornou numa via privilegiada (em muitos casos, a única), de ascensão económica e social de gente sem qualificações ou atributos, a não ser a capacidade para obedecer e berregar em consonância com o rebanho. Um louvável desígnio nacional, seria o de subverter a desforra, o escapismo e o debate do instantâneo, na imperiosa alteridade dos valores dos portugueses. Conseguiremos nós sair de «dentro de uma pálida e morna infecção de banalidade»?