Opinião
Por onde anda a Europa?
O que tem emergido é uma espécie de “sopa da pedra”, em que a Europa é a “pedra” e o resto da “sopa” são as questões internas que logo daí derivam
Meu Caro Zé,
Escrevo-te antes da realização das eleições europeias, já que a minha agenda não se coordena com a hipótese de o fazer a tempo da publicação da “missiva”. Pensei, por isso, escolher outro tema, até porque, como te lembras, na última “carta” abordei o assunto, com baixas expetativas de uma coerente e conhecedora abordagem dos assuntos que a Europa tem de defrontar, de vária natureza, sem deixar de ter em atenção a situação de Portugal no contexto do desenvolvimento da Europa.
Dois problemas me preocupavam: a falta de conhecimento e envolvimento de muitos dos candidatos que constam das listas dos diversos partidos e a prioritária e quezilenta discussão das “coisas e coisinhas” internas visando umas futuras (e para muitos desejáveis) próximas eleições.
Sem embargo de reconhecer os esforços de alguns jornalistas, comentadores e também candidatos a deputados europeus para que algumas questões relevantes de âmbito europeu fossem abordadas, o que tem emergido é uma espécie de “sopa da pedra”, em que a Europa é a “pedra” e o resto da “sopa” são as questões internas que logo daí derivam. Às vezes ainda derivam para uma desejável discussão do papel de Portugal na Europa e do peso desta nas decisões em Portugal, mas, infelizmente, a maioria das vezes é para discutir acontecimentos internos.
Mas nada disto estava na minha mente escrever hoje, se, inesperadamente, a primeira preocupação que mencionei – a falta de conhecimento – não tivesse sido posta à prova quando, no rádio do carro, passava uma entrevista a um candidato cujo currículo, idade e estatuto, poderiam garantir que esse conhecimento existia.
Interrogado sobre a sua posição face ao objetivo de concretizar a neutralidade carbónica, no contexto da luta às alterações climáticas, o candidato não só foi contra, mas “esclareceu” que tal era impossível, pois deixaria de haver CO2 na atmosfera e a vida das plantas e das aves (só?) seria impossível.
Afinal, eu estava enganado! Não há falta de conhecimento, há uma ignorância que corre o risco de perverter a opinião pública. Confundir “neutralidade carbónica” com CO2 zero na atmosfera atinge as raias do absurdo.
Esta não é, felizmente, a imagem de todos os candidatos, mas é um perigoso sinal de que os meus receios estão cada vez mais próximos de se confirmar.
Fica sempre, no entanto, um espaço para a esperança, pois há lá candidatos que vão ser eleitos e podem (e vão com certeza) melhorar esta triste imagem.
Até sempre,
Texto escrito segundo as regras do Novo Acordo ortográfico de 1990